domingo, 12 de outubro de 2008

Terceira Pessoa

Tudo o que ele quer é desabafar. Esta noite ele dançou. Dançou como se ninguém o pudesse ver. E ninguém, de fato, o viu, apesar de estar rodeado das pessoas mais estranhas das redondezas. No alto, havia uma luz demoníaca e ameaçadora. Seu corpo estava esgotado, mas era tudo muito eletrizante, seus poros clamavam por cada vez mais ação. Os vultos giraram, as paredes tremeram, o chão se perdeu dos pés, e ele sorriu.

Saiu daquele inferno, e pôs a cara na rua. Sentiu que ainda estava flutuando entre os mortais. Aos poucos decolou, até dar com o nariz na piscina. Sentiu algo simples, uma constatação, uma ameaça, um sussurro destruidor ao ouvido...

-Cuidado. Muito cuidado com o que vocês falam! Olhem só para ele! Cada pequena palavra mal escolhida pode rasgar seu estômago de cima a baixo. Ele pensa que não é assim, ele não percebe, mas é assim, sim! Ele pensa que é mais forte que isso, mas uma simples palavra, por menor que seja, pode fazer com que sua dança aumente o ritmo, pode fazer com que ele esboce um sorriso, pode fazer com que ele rodopie, pule, ou dê com a cabeça na parede, ou tropece sobre si mesmo, torcendo o pé e caindo com a língua entre os dentes. Ele jura que não, que é resistente a isso, até perceber que seu nariz está sangrando, e que é preciso correr ao banheiro para que ninguém veja.

É que hoje é aniversário dela. Vinte anos. Não que ela ainda mexa com ele, mas, de certa forma, parece que sua voz estava ressoando pelas milésimas paredes dessa noite.

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