segunda-feira, 20 de abril de 2009

Viajar

Era só eu e a Lua, ali. Contemplava a distância que nos separava de forma tão preenchedora...

É em pequenos momentos como esse que a vida se mostra reveladora, e ao mesmo tempo, misteriosa. Diante de mim, havia um rio, uma superfície, apenas uma superfície, que escondia um universo cultural de encantarias, narrativas e ser humano.

(Me lembrei de uma amiga que dizia que, ao olhar pras estrelas no céu, ficava imaginando alguém, na estrela, olhando para nós. Do ponto de vista desse observador, nós somos tão insignificantes, que o nosso planeta, que é tão cheio de fluxos e histórias de vida, pode ser um pontinho no céu. O que essa contastação muda na minha vida? Sei lá)

Mas um elemento passou entre mim e a Lua, no meio dessa nossa conversa. Era um avião no céu. Então, passei a exercitar uma certa sensibilidade no olhar... Percebi o quanto uma viagem de avião pode ser significativa pra alguém, porque é sempre uma mudança de estado, de ambiente, de vida... E o avião ficou lá no céu, diminuindo, diminuindo, até virar um pontinho tão menor que uma estrela.

Lembro muito bem. Era enquanto todos se divertiam. Me afastei, e sentei naquele trapiche. Fiquei por lá um bom tempo... os barcos passavam, lentos, e me provocavam medo e fascínio. Em plena madrugada, pessoas remando, em diversas direções.... Ficava pensando qual o destino de cada uma delas. De repente, dei de cara com um homem, que remava muito, muito próximo do trapiche. Mas ele passou direto, sem me olhar, como uma assombração.

E é aquela mesma liga, sabe? De ficar contemplando o quão pequeno se é, diante do desconhecido do futuro, e das pessoas que passam por nós. Foi aí que veio o avião. Luz pairando no céu, despreocupada com os dramas pessoais de quem a vê no caminho, ou com a existência daquelas pessoas, navegando tão devagar no meio da escuridão. Uma luz cujo brilho vai diminuindo, diminuindo, lentamente, pra brilhar cada vez mais distante, até sumir do campo de visão.

Percebi o quanto uma viagem de avião pode ser significativa pra mim, porque é sempre uma mudança de estado, de ambiente, de vida... E o rio foi, diminuindo, diminuindo, lá embaixo, até virar um pontinho tão menor que uma estrela.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

C'est fini.

“Vai beber água pra engolir o choro” – diz ela. Não suportando, sigo seu comando. Realmente ajuda a aliviar o conflito entre meus olhos e a infeliz água salubre. Insuportável, não dá. Não é possível. Drama? Aos caralhos com o drama. Este quem sente sou eu, somente. Nem tente, pois só eu o sinto na pele.

Tenho paciência, tenho limites. Tenho paciência com limites, e estes já se esgotaram. Não há mais tentativa de placidez, apenas a raiva. Há raiva, desgosto. Novecentos não é nada. Isso não se faz necessário, preciso de tempo, segundos, minutos, semanas. Meses. Solidão, encontro comigo mesma.

Sociedade estúpida, ignóbia. O pensamento chega na esquina, porém nunca passa dali. Continua conversando e cantarolando com o padeiro e o barbeiro, que afogam seus infinitos minutos da hora de almoço. C’est fini. Acabado.

Gotas de chuva amaciam o asfalto, contrapondo sorrisos das plantas e gritos cheios de buzinas dos motoristas. O pensamento parou, está no engarrafamento. Não sai dali. Está atrasado, mas não consegue se mexer. “Eterno esse engarrafamento” – dizem aqueles que estão (in)compreensivelmente estagnados na mesma compreensão de mundo.

Não quero ler o jornal, cansei de sangue, besteiras diversificadas. Meus olhos já não conseguem observar tamanha deturpação de dados. Escapatória? Não há. Ah sim, a irresponsabilidade, vontade e necessidade de fuga repentina e rápida.

Grampos, pregos e relâmpagos. Galápagos. Intactos e estragados, como sempre há de ser.

(Delianne Lima)

Tu, tu, tu, tu.

Como se nunca antes houvesse existido. A tua voz, vazia, não me remetia à nada. Vazio. Expoente. Voz estranha, timbre confundível. Não parecia tu, não parecia minha fantasia, meus fantasmas escuros. Desprendi-me. Não tenho mais nenhum contato com aquelas antigas correntes que fortemente me prendiam a ti. Não és tu. Não mais.

Como se fosse alma, como se fosse lembrança. Apenas na minha memória passaste a existir. Hoje és estranheza pura. Não há mais saudade, não há mais físico. Não me chamas como antes. Não há chama.

Desenvoltamente me desloco de teus braços. Tua voz. Teu timbre. Há distância agora no teu timbre. Não me sinto abraçada nas tuas falas. São vozes estranhas, abertas, fechadas.

Não te conheço.

(Delianne Lima)